sábado, 24 de setembro de 2011


não guardo moedas nem sonhos de infância

ajuntei como pude palavras de céu alvejado

como se ajuntam vacas sagradas

para a ordenha

o deleite da vida na manhã virginal

colecionei lembranças de lençóis ao vento

presos em arame farpado

tudo em caixas de sabão minerva

ao lado de garrafas vazias

pedaços de corda de bacalhau

raramente entro neste quarto de despejo

sexta-feira, 23 de setembro de 2011


nada além do tempo

alheio ou único

bonito ou feio

ao olho nu do outro

me bifurco

tudo por acaso se mistura

se instaura sem receio

meio aura de dragão

meio asa de urubu

cortado ao meio

alfabeto em pânico

cavalo e vento

galope e freio

tudo se afigura incerto

estranho e cru

conforme o pacto

o peso

o pathos

o espasmo do verbo

desatento

o cozimento do asno

do pensamento obeso

tudo mundo de espanto

concreto sol azul

no firmamento fora do prumo

tudo em luta

no pântano do espelho se dilui

quarta-feira, 14 de setembro de 2011


prepara tua solidão

e escuta

é sobre ti que diz

este poema

sobre a humanidade oculta

em teu gesto único

fala resoluta

palavra extrema

segunda-feira, 12 de setembro de 2011


em tua solidão

está o teu sentido

o tecido de cada dia

a provação de tua existência

em permanente conflito

porque de nada ti adiantará

mergulhar no oceano

se dele não tiveres consciência

se com ele te confundires

abraça tua solidão

com todo o teu espírito

e tudo verás de perto

sem medo e sem fantasia

domingo, 11 de setembro de 2011

negócio da China
o ócio não germina
sobre pedras
fica no cio em qualquer lua
quando o amor termina
engorda longe dos olhos
do dono
come quando tem fome
dança quando quer
dorme quando tem sono
vê TV ao meio dia
adultera o dicionário
lê romance de cavalaria
joga futebol na grama do jardim
vídeo-game e gamão
ama a mulher do rei beócio
a top-model
a dama de vida difícil
a mucama
ri sem pedir licença
a Irene ou a Luzia
ama mesmo sem cama
ócio já foi pecado mortal
em Roma
crime capital em Alexandria
agora é charme
tema de pesquisa científica
moda de gente rica
coisa de classe
rende juros
poesia
dá fama
dá rima
o ócio sem culpas
é coisa fina
é dom do homem livre
recompõe os ossos do ofício
não presta conta ao fisco
anima o espírito das coisas
a alma indócil da cúpula
negócio da Chima
o ócio não é coisa para imbecil
não é preguiça qualquer
não é jovem nem senil
ócio é ócio
nos braços de qualquer mulher
quem tem ócio está no céu

onze de setembro

joão evangelista rodrigues

New York New York

a cidade exótica treme

chora ao som de um blues

flores de fumaça

de fogo e vento voam

sobre as ruas em ruínas

explodem tombam de orgulho

as torres gêmeas

entre folhas de fatura

de um negócio escuso

cobrem de veneno e horror

as almas

a raça em pânico

a fratura exposta

mostra a outra face

do Gênesis

um furacão de pombas

perfuram as pálpebras do mundo

inglórios reis se curvam



quarta-feira, 7 de setembro de 2011


o que de melhor herdastes na vida

foi a própria vida

a sabedoria que há de vir

com o tempo

de prazer ou de penúria

não apresses portanto

os passos do tempo

o ritmo

do que por natureza ti pertence

a morte não tem preferências nem pressa

é pontual e precisa

hospitaleira e eficaz no seu ofício

a todos contemplam com igual solicitude e benevolência