sexta-feira, 12 de março de 2010



nada

nada aprendemos com a morte
no Calvário
no Horto das Oliveiras
não há choro
nada é necessário

a morte dos pássaros e dos rios
das geleiras e florestas
a morte dos peixes
dos bichos de terra firme
nada nos ensina
nem mesmo a morte de nosso melhor amigo
de um parente mais próximo
dá-nos algo essencial
sobre a vida precária
a que em nós teima em resistir
por insistência do corpo provisório
castigo do espírito insaciável

à todas as mortes assistimos
impávidos e inertes
entre omissos e impotentes
mas avenidas e estradas
nos templos e cavernas
nas arenas e super-mercados
nas fábricas e estádios
como se assiste a um ritual de magia
a uma luta de serpentes
a um programa imbecil de TV

a notícia da morte por e-mail
se mistura a imagens de catástrofes
e “spans” de mal gosto
a comentários políticos e inócuos
sobre o cotidiano de um herói sem caráter
de um país sem imaginação

a tudo se iguala a Tal
sem rosto
em consórcios de consumo
sem perceber nos consumimos
em espetáculos sucessivos e recorrentes
sob rótulos e slogans
os mais diversos e eloqüentes

nada aprendemos com a morte
alheia
por mais estúpida e feia
estampada nos jornais
na Internet
com as mortificações globais
menos ainda aprendemos
com a mobilidade das nuvens
com o discurso dos sobreviventes
no percurso de nossa própria morte

nada aprendemos com a morte

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