quinta-feira, 30 de junho de 2011


sobre si mesmo se dobra
a linguagem
cobra que a
si
se morde
nada vê fora de sua linhagem
na órbita icônica
dos olhos
tudo desimagem
luto e desencanto

a vida sob o sol não conta

agora vale
o mínimo fragmento
o ralo
o raso pensamento
o reles
só eles como evento
só o sol deles
o micro relato desatento

quarta-feira, 29 de junho de 2011


o que procuras no poema
quando curvas sobre o livro
tua fronte
o ideal da vida
o dial do tempo
a alma da letra
o murmúrio da água
da pedra e do vento
o movimento da língua
do mundo sem ar
o puro alheiamento
o diálogo impossível
de teu espírito com tua sombra

o que procuras no poema
é dele mesmo raiz e fonte

segunda-feira, 27 de junho de 2011


estética
pela beleza da pedra
chega-se à pedra
chega-se à flor
pela beleza da flor
pela dureza da palavra água
pelo o que na palavra se afia
a língua o limo a larva
gera em flor a afasia
a aura da pedra seu discurso
o lírio do medo
o lírico segredo de tudo
no intestino das coisas
a poesia da água
seu repouso

domingo, 26 de junho de 2011


muros obscuros me acenam
protegem paisagens obscenas
irrestritos territórios
campos virtuais
baldios terrenos
passo pelo furo do poema
escalo espirais em movimento

quarta-feira, 22 de junho de 2011


por cegueira ou por milagre
da linguagem
o menino cavalga
a mangueira do quintal
apanha
pássaro-assanhaço
o seu azul celeste
no galho mais alto
a paisagem das letras
reverdece

quarta-feira, 15 de junho de 2011


T S Eliot caminha sobre a terra arrasada
evita os olhos ocos da multidão
da turba que vaga pelos campos esfarrapados

sobre a terra arrasada
semeia seu poema sem esperança

T S Eliot olha da ponte
o vazio da Ilha da Manhatan
as homens à beira do Tâmisa
entre America e Europa tudo terra arrasada

segunda-feira, 13 de junho de 2011


porque palavras são peixes
de escamas brilhantes
ferrões envenenados
moram em águas profundas
Inacessíveis às vezes
à superfície dos sentidos

porque são selvagens
as mais preciosas e exatas palavras
escrever é luta contra os abismos
de nós mesmos
é olhar para fora e ver o invisível
o essencial das coisas triviais e humanas

escrever é pensar com a imaginação
mundos hostis nunca visitados

sábado, 11 de junho de 2011


através da água
vês teus pensamentos
imagens trêmulas
luzes irregulares
lâminas de sombra
firmes fragmentos

sexta-feira, 10 de junho de 2011

se penso pedra rola
no imenso império
do poema
na memória
se falo pedra fere
língua afiada
fere a pálpebra
a paisagem dos olhos
pedra por pedra cai
no que faço
se
falsa lua de vidro
se quebra
contraditora e óbvia

terça-feira, 7 de junho de 2011


o que tem o poema
a dizer
do poema que diz
além de si
mais leve acontecer
o que diz o poma
sobre o poema
que tem a dizer
além do que diz
querer dizer
além do dizer
não dito
extrema forma
livro labirinto
livre plataforma
de ler
fora da lei
fora da grei
o infinito
poema só prazer
só palavras
inscrito ao se tecer
ao vento
na pele
na pedra de granito

o que tem o poema
só poema a si dizer

segunda-feira, 6 de junho de 2011


assim teria falado Górgias
o grego
em tempos atuais
aos dele sob mu itos aspectos
tão semelhantes :

jamais levantam os olhos para o alto
sempre enfiam a cabeça na terra
bestas de pastagens
vangloriam de sua própria insensatez
roçam a língua na grama áspera e seca
comem sem fome
bebem sem sede
gozam sem prazer
esgotam as amenas veredas
e pastagens
em vertigens de ira
lutam uns contra os outros
com unicórneos eletrônicos
títulos honoríficos
e cascos de ferro

a seus olhos vazados pela ganância
seus semblantes são terríveis e amargos
nunca se interrogam
nunca perguntam
nunca sorriem
nunca perdoam
nunca desistem de suas presas

roubam em plena luz do dia
o verdadeiro tesouro
da alegria e da amizade
beijam as faces de Judas
bajulam
rejubilam entre si
com o sofrimento alheio

elegem como inimigos
os espíritos verdadeiros
os manos de coração

matam uns aos outros
por alguns vinténs
falsos dólares furados

tudo aceitam
sem culpa nem piedade
são insensíveis seus sentidos
insaciáveis seus desejos

freqüentam
por isso brindam nos banquetes
transformam a vida em permanente festim
a morte ronda suas cabeças de mármore
cobertas com flores de flandres

adoram adornam a si mesmos
com fitas de cetim
jamais elevam sua alma de pedra
acima das montanhas
jamais olham para o alto

assim falaria
Górgias
em seu nome pronuncio



dialética

claro que a pedra
como tudo se move
a pedra e a água
o seu em torno
a contorno das formas
da lua gorda
sobre as montanhas
imóveis na aparência
da cidade inerte
o pássaro solerte
mesmo quando pousa
feito folha presa no caule
o tronco do arbusto
o pouso mesmo trono
tudo se move e canta
às vezes para sempre
fica mudo no ramo escuro
claro que a pedra
feito a pele do corpo
move-se no túmulo
o túmulo sobre si mesmo
se dobra e se transforma

e por mais bela a forma
a arquitetura dos olhos
há uma triste visão no fundo
de tudo o que não se move
ou se partir resiste

claro que a pedra do reino
não dura para sempre se move