terça-feira, 31 de março de 2009



renuncias
à literatura sem vida
à ditadura da gramática
à liturgia das rimas
ao ritual das mímicas
ao vil metal
aos sete sacramentos
da palavra submissa
renuncias a satanás
ao demônio da crítica
em nome da paz
entre homens e mulheres
de todas as pátrias
entre os poetas sem escolas
de todas as vontades
renuncias à história da infâmia
em nome de Orfeu
ao céu do Olimpo
ao dicionário de empáfias
a terra é pequena e concreta
renuncias á calmaria dos eventos
à feira dos sentimentos
em nome do Cão de Ulisses
renuncias ao carnaval do espírito
de todos os deuses
a todo o ornamento
a terra e um grande deserto
renuncias à gula
ao orgulho
à agulha que lhe costura a alma
em nome da água escassa
da águia de sete cabeças
aos sete pecados do capital
renuncias a ti
poeta
em nome da poesia


entrego-me a Vênus
ao vento cósmico
misterioso movimento
tudo ignoro
intriga-me de repente a cerca
“Penso logo, existo”
insisto em pensamento
lógico
impreciso e lento
o mundo se desaba
à minha frente
pego o mapa com as mãos
restauro pelo sentimento
o poema incontinente nuvem
profundo embaçamento
abro a cortina da linguagem
tiro a ferrugem do tempo
de nada sou distinto
concreto inútil fragmento
me foge ao tato a pedra
ao paladar por dentro
procuro meu escuro invento
cego raciocínio me provoca
pela poesia escavo a vida
todo o dia pelo menos tento

sábado, 28 de março de 2009


sob suspeita
o poeta escreve
a meia noite
a meia luz
ignora a lei do silêncio
a liturgia da lei
o movimento da rua
o regime do tempo
a cidade cega
adormecida sob a lua rubra
escreve com palavras dúbias
escapa aos olhos
do grande irmão
do guarda noturno
do governo diuturno
ao controle de qualidade
das leis do lucro
das rendas da escritura
das regras do grupo
do sermão das manhãs

escreve escava a gruta
escuta o som da palavra acesa
escapa pelo ferrolho da literatura

quinta-feira, 26 de março de 2009


exercício poético

Cruzeiro x Atlético
a torcida faz guerra no estádio
nada de novo
no campeonato mineiro
no balé dos gladiadores
nada muda
o estado das coisas
as cores das bandeiras
a bola continua redonda
no final de mais um domingo
radioativo
tristíssimo
poesia não é jogo
é luta corporal
prazer físico exercício poético

quarta-feira, 25 de março de 2009


Mimas submissa
mística alegoria
se ourifica em brumas
etérea substância
em linhas gerais
se esvai
entre montanhas
castiçais
ntre muros escravos
comensais
entre luas de neon
e salários mensais
liberdade em silêncio
nos horários de expediente
só nos obedientes comerciais

a luta insone
os sonhos
os sinos da realidade
os inconvenientes sinais
da poesia inconfidente
esses não
não se tocam mais

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009




Tranversias
Minas,suas vias e avarias

Por Ronnie Francisco Cardoso*

Resumo: Resenha do livro Transversais,de João Evangelista Rodrigues.Contagem,MG.
Santa Clara Editora de Livros,2002.
ABSTRACT: Review of the book Transversias,de João Batista Rodrigues.Contagem,MG:Santa Clara Editora de Livros,2002
PALAVRAS-CHAVE: Resenha. Minas. Transversias.
KEYWORDS: Report. Minas. Transversais.



O poeta João Evangelista Rodrigues fotografou Minas em suas Transversias:captou a geografia da língua que tão mineiramente exercita. No prefácio do livro (Transversias,Contagem:Santa Clara Editora de Livros) o professor Júlio Pinto observa que “a linguagem de João é assim,é lista que enumera haikaimente as fotografias de Minas em passo estroboscópico,marcando intervalos de luz”.
Pela objetiva do poeta,a Minas que em seus versos se multiplica em prismas e rosetas só pode ser aprendida à contraluz,pois sua imagem persiste inextricável.Da paisagem mineira,fixou a vastidão,o desenho,mas também abriu sua lente subjetiva para as intermitências ,as lacunas,os vazios,para que na geografia do texto sobre apenas os elementos necessários para o leitor montar e remontar a sua própria cartografia de Minas.
O que é Minas?Em Transversias,talvez seja o resultado da sua silhueta semovente,ma qual se confronta o arcaico e o moderno, o sacro e o profano,o comezinho e o acadêmico, a denúncia e a comemoração, o senhor e o escravo, o iletrado e o gramático.
Bem ao sabor barroco, o itinerário afetivo descrito pelo poeta João Evangelista Rodrigues define Minas a partir de marcas.Rastros que se acumulam ate demarcar provisoriamente o mapa íntimo e multifacetado das Gerais,que abarca:escrituras ns baús, o repertório de nuvens, refrões e oráculos,a folia de reis, os devotos, o casamento arranjado, o truco de pouca prosa, o fazendeiro arrogante,o arsenal de garrucha, o desfile de bestas,a rede de rendas,o bestiário, o relatório de injúrias, o peso do escapulário, o tempo mal-assombrado.A tudo isso se junta ainda, os andarilhos oníricos,os confrades e os comparsas, os convivas underground,os traficantes de esquina,os escritores nos bares.
A Minas líquida que o poeta observa encontra uma “pedra no caminho”,que na configuração subjetiva do espaço literário e geográfico mineiro delineada por ele é, metonimicamente, “a frase de Minas a que ainda se exibe / a que de dentro e montanhosa se adensa no poente / e de geografia em geografia de silêncio se exila / e que de dente em dente se arrebenta por dentro / se perde no percurso / de túnel se perfura ou as insígnias se insurge.”Sintonizada com sua época, a “antena paravólica” do poeta capta e descreve um tempo de muda.Aqui a “pedra” de Carlos Drumond de Andrade,mais do que atravancar caminhos é a “palavoura” através da qual se reconstrói um novo percurso poético, é o que permite o alicerce de outros versos que avançam sonoros e escorregadios ao encontro de um marco geoliterário: “na veia mesma de Minas / na pedra esquiva do verbo / a pedra no caminho.”
Na vocação arqueológica que percebemos nos versos de Transversias,a escavação é o processo a partir do qual se rompe com a imobilidade do óbvio e possibilita abrir a “vasilha de cinzas”, “ válvula de escape” a “vitrine dos mortos”.Na abertura que se faz,identificamos vozes e personagens da tradição literária mineira, encontramos Marilias e Dirceus, o José, de Drummond, os oráculos de Adélia Prado,o traçado mágico (seria o do Rubião) e múltiplo (seria o do Mendes) dos Murilos, as travessias e imagem terceira remetem ao mesmo Gerais que Guimarães Rosa amplificou e universalizou.
Minas é isso: muitas vias de acesso e de excesso.Cabe ao leitor descobrir as múltiplas formas de atravessa-la , de refazer sua geografia interna.Então, voltemos às Transversias de João Evangelista Rodrigues.Cada um que faça o seu próprio traçado.

* Bacharel em Comunicação Social pela UFMG
Mestre em Teoria da Literatura
Doutorado em Literatura Comparada pela Faculdade de Letras/UFMG
Estudos Literários.

Reseha publicada originalmente na Radio em Revista – Universidade Federal de Minas Gerais – Departamento de Comunicação Social-2 008-V4 n1/2

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009


corpo
sexy
top model
só pele e osso
por pouco
pelo pódio
pobre colosso
morde
come o sol
perplexo
porco gordo
morre

terça-feira, 27 de janeiro de 2009


tudo no poema
palavra inaugural
o que resta de tudo
mito sem face
sem fundo
tudo em verbo
constelar se funde

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

não por acaso o caos não canto
não conto causos
não me ufano de ser humano
nem brasileiro de ser urbano
sou por inteiro
um engenho de enganos
observo a infâmia dos homens
a infidelidade do idioma
a infelicidade dos anos
nego o acesso fácil
a face neutra dos objetos

pego o que posso para meu sustento literário
vivo de restos e miudezas sem cotação
não me queixo nem espero nada
do passado eterno
sou marcado pelo tempo
de homens marcado
pelo vento pela chuva
pelas tempestades do deserto
pelo excremento da mídia
pelo que excede
pelo que fede do abdome do globo
pelo que pesa no dorso do Planeta todo
falo sobre o desencanto
sobre o desencontro
sob escombros e sombras de sangue escrevo
prefiro a morte a ser escravo
de nada serve o verso
se for servo do perverso tempo
desde o inicio do Universo pelo avesso escrevo

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009


nada aprendemos com a morte dos inimigos
morrem os pássaros e os rios
os pais as flores e os espinhos
morrem os homens de um pais distante
nosso vizinho

pouco aprendemos com a morte de nossos amigos

três punhados de terra
algumas lágrimas nervosas
voltamos para o sem mistério
à retórica burrice de cada dia
mais morto do que vivo
nada se aprende com a própria morte

sonâmbulos seguimos mais ignorantes e sozinhos

sábado, 10 de janeiro de 2009


dos dizeres do poeta
( Imagem a prtir de um poema-objeto de Rosane Magalhões)
o que diz o poeta
com sua fala sempre incompleta

o que diz o poeta
quando o alvo se dispara contra a seta

o que diz o poeta
quando o verbo se fecha sobre a paisagem aberta


o que diz
o poeta diz somente do que lhe afeta

diz do que lhe falta
do que prediz ou lê nas cartas

o que o poeta quando diz
porque nada diz quando fala em voz alta

o poeta diz do som da flauta
do magnata infeliz que se mata
da engrenagem da máquina
da viagem a Marte
dos martírios por nada
das morte do poema da poesia insensata

porque desejam silenciar o poeta
porque o silêncio sela sua voz seleta

é proibido ao poeta dizer
se não for de forma concisa
sintética
se não for hermético
é possível ser poeta
sem fingir
sem aderir ao patético
sem ser parnasiano
romântico
simbolista
modernista ou concretista

sem ir ao supermercado das letras
ao cinema novo
ao comitê do povo
ao circo do cinismo literário
sem ser esperte ou otário

ao se ajoelhar diante do olhar
solar de Van Gogh
em se jogar no abismo do verso árido
sem cair do pico do Itacolomi
sem mudar seu fuso horário

o peta e seus dizeres
o poeta e seus prazeres
o poeta e seus pesares
o poeta e seus díspares
o poeta e suas essências
o poeta e seus aparências
o poeta e seus mal ditos zelos
o poeta e suas íntimas letras
o poeta e seus pêsames

é possível apenas ser poeta
sem paisagem
sem ornamento
sem passagem pela delegacia
de bons costumes
pela poesia sem perfume

o que diz o poeta quando em silêncio apenas ri

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009


o que me interessa em literatura
é a alma do homem
não a alma etérea dos místicos
e dos santos
não a aura dos profetas e anacoretas
a artimanha das cartomantes
caminho de pés descalços
por regiões mais concretas
piso no chão da fábrica do poema
no piso da rua onde moro

remexo o lixo da alma
o estômago da fera
sujo as mãos a cara de lama
lavo no sangue cotidiano
a máscara da mídia
do reclamo pulbliciotario

interesso pelo resto da lata de conservas
não pelo extraordinário
a linguagem impura das putas
as conversas sem reservas
sem atualidades
nem valor utilitário
não tem padrão nem padrinho
minha escrita em pânico
que se dane o dom
o dono da fantasia
o sumo pontífice do consumo
pouco me importa se
o crítico ruminante
cifra come a formula literária
queima gerúndios e adjetivos
n fornalha da escrita se forma o mal gosto
o mal cheiro da genitália do mercado de miçangas

escrevo quando o silêncio manda
conta minha alma de pedra grita a poesia

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009


o grilo trila na folhagem
de acrílico
alucina a linguagem noctívaga
do ventríloquo
esquece asas e bagagens
a cabeça no limite do vôo
vaga aterrissagem

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Olá, se você gostou , favor comentar e divulgar. Endereço; jevare@uai.com.br

sem ornamento
a pedra angular sustenta
o cerne
o sangue
o sêmen do poema
até que um dia o dúbio fruto
o não dito se arrebenta

definição

estilo não é enfeite
é linha reta
suspeita arqitetura
que o poeta
intranqüilo projeta
em vão procura

sábado, 3 de janeiro de 2009

virtual

mal surge no vazio
se oferece
olhos e dedos
bocas e dentes
cores e sons
entra pelos poros
some nos cabelos
letras sensuais bebem os lábios
sob luz de pedra
surge na tela branca
poesia célere desaparece
falsos aplausos
breves apelos

o poema virtual permanece
preso entre os nós da rede

Comentários para:jevare@uai.com.br
Olá, caso você passe por aqi, por acaso ou acidente de prcurso, leia , comente e me mande um -email para: jevare@uai.com.br.Obrigado. João

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

estilo
«A única maneira de defender
a língua é atacá-la»
Marcel Proust
inscrevo-me no tempo necessário
na crista do galo canto de cristal se dissolve
não sou escravo de aluguel
peixe de aquário
bacharel de queixas
guardião de bestas
sou operário do verso
não sou otário
não sou escravo da língua matriarca
monarca
arquiteto do universo
não tenho pressa
na morte me completo

aqui
a contrapelo da pedra me confesso
arremesso palavras mal iluminadas
contra o selo de qualidade
dos textos literários
contra o mofo das bibliotecas
privadas
das jóias poéticas hipotecadas
no cartório público
escrevo contra o lirismo fácil
preso no peito tatuado
nos armários de família
contra o reumatismo dos dicionários
de rimas
de rusgas
de rixas
contra o hermetismo compacto das lagartixas
em concílio
contra estética da ordem
da honra do mérito
do bêbado equilíbrio das formas
no espaço aéreo
escrevo
a favor dos parias
dos piratas inconfessos
da pirotecnia dos sonhos
da clássica desararmonia dos gestos
dos dilúvios de desejos
dos verbetes marginais
da veredas desiguais
escrevo nos muros
nas marés
no jornal mural
no pé da escadaria das igrejas
nos suplementos de todas as receitas

sei que o mar não está pra peixe
que o tempo nada promete
que tudo que se disser
é fora de propósito
motivo de escárnio
não merece crédito
da crítica do ministério único
que todo manifesto é objeto póstumo
inoportuno e insólito

insisto mesmo assim no dito
invisto contra as palavras vanguarda
engajado
maldito

por nada deste mundo apago
pago o preço de mercado
pela vida e pela bolsa
pelo que fiz de toda a minha escrita
pelo que fiz e aqui repito

escrevo contra a palavra em minha pele
contra a palavra que não fere
contra a palavra eterna
bela forma de granito
o barco da morte não tem pressa
seja no rio ou no mar
nas nuvens
o barco vem sempre devagar
segue a corrente dos dias
segue a vontade dos ventos
vem sem ninguém o comandar


em vão se espera no porto
a hora do barco passar
em vão se avisa ao morto
sobre os modos de remar

o barco da morte não se atrasa
não tem hora de chegar

em vão se debate o vivo
a gaivota a velejar
nada lhe resta fazer
senão ao morto chorar

o barco da morte não tem pressa
em breve irá se atracar

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009


nada sei do que sou ou fui
tentando ser
um pouco de mim solidão
entre árvores e passarinhos
um pouco
ficou naquela ruazinha franzina
outra parte perdi
pelos caminhos de pedra calcária
pelas ciladas da cidade desvairada
a parcela mais querida
roubaram-me ainda na infância
a vida por se fazer

agora aqui estou
mais leve do que pena de pavão
a olhar o tempo anterior e breve
inteiro no que me resta
fora do que nada me serve
desnudo de tudo pronto para voar


amar é arte para iniciados
não para inocentes
para poetas performáticos
contorcionistas verbo-sexuais

ama-se em silêncio o impossível amor
à mercê do tempo do verbo intransitivo
da obediente fertilidade da carne
nada mais

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008



a sete chaves me fecho
a sete quedas me lavo
a sete laços me prendo
a sete nomes me xingo
a sete copos me bebo
a sete selos me calo
a sete livros me leio
a sete letras me falo
a sete casas me abrigo
a sete leitos me durmo
a sete facas me mato
a sete beijos me rendo
a sete mortes me aceito
a sete abraços me solto
a sete cartas me jogo
a sete vozes me vingo
a sete ventos me deixo
a sete anos me espero
a sete chagas meu peito
a sete velas me apago
a sete versos me levo
a sete portas me abro
a sete potros me pulo
a sete pontes me ligo
a sete amores me apego
a se estradas me perco
a sete mares me entrego
a pedra sete em resumo
a sete dentes me quebro
porém a sete moedas
a sete máscaras de ferro
a estas nunca me cedo
a estas nunca me vendo

espero o Ano Novo
como quem espera
no espelho áspero do tempo
um novo rosto
como quem espera
renascer do seu passado
um futuro diferente
o que restou do ser amado
mo mesmo velho rosto sorridente
não freqüento nenhuma escola poética
nem por isso sou analfabeto
sou livre
adverso
percussivo
signo animal perplexo


segunda-feira, 29 de dezembro de 2008




ah! o espírito de Minas!
o que pela manha me visita
esta poesia sem corpo
sem consideração pelo que vivo e sofro
essa escrituração sem fim
no chão
na areia
no lodo
no lado oposto do que vejo
do que por mim aprendi
às soltas pelas veredas
esse cavalo doido
sem rédeas
sem pasto
sem paragem
assa paisagem semi-morta
esse cartão postal
debaixo de minha aporta
esta dissimulada desconsideração
pela vida
esta neurastênica afetação
à moda inglesa
essa herança de letras
de escrituras amareladas no baú
de retratos e retretas
esse sabor de requeijão
esse cheiro de café
esse repertório de rezas
esse cemitério de ócio
esta fingida desconfiança
do óbvio
da faina da mídia
pelo que não domina
pelo que por invencionices da alma
no coração se insinua
esta sutil alegria
com o infortúnio dos parentes
com a tristeza alheia
esta ambição
esta fome de ouro
de escravo e gado
esse pendor pela inveja
pela sediçao
essa insaciável vocação
para a acumulação de renda
de terra e tédio
esse discreto ascetismo da razão
essa faina sem trégua
pela posse
pela glória de deus
pela força da lei
pelo demo
pelo que hei-de
pelo que desconheço
pelo que não tenho
pelo que não temo
essa colheita cotidiana de ojeriza
pelo que não sucede
esse gostinho soberbo
pelo pódio
esta velada necessidade de sonhar
de proclamar o silêncio
de respirar a honra
de proteger o sexo das nuvens
esta hipocrisia
essa infâmia em família
essa homilia de queixas
essa humilhação noturna

essa porteira fechada
esse medo do Inferno
este céu de chumbo
entre montanhas mutiladas
essa mutilações invisíveis
esse pendor sem cura
pelo poder
esse gosto pela arte da traição
pelas obras sacras
pelo sacrifício
pelo sacrilégio
pelo sacramento
pelo tiro nas costas
pela sedução barata
pelo casamento indissolúvel
pela comunhão de bens
pelo prazer profano de ser mineiro
pela profanação dos túmulos
dos oratórios nos museus
dos oráculos às escondias
esse anjo barroco
esse oco de mundo
essa donzela de branco
esse túmulo visceral
esse mal sem remédio
esse mal entendido
esses contornos ilegíveis
entre a honra e o crime
esse auto-elogio sem pejo
entre a nota promissória
e o cheque sem fundo
essa sina sem volta
de se ter nascido entre serras
de vagar por Minas
feito cachorro sem dono
de se escapar pelas gretas
esa identidade às avessas
esse sono de pedra
essa mineiridade insuspeita
o que de modo essencial
move á fé a face o disfarce
o montanhoso orgulho de ferro

? seria isso Poeta o espírito de Minas!
ou signo mais mineral
renasce no abismo sob nossos pés
cansados de descer e subir ladeiras
de esculpir palavras de lapidar a pedra?

? seria isso Poeta o espírito de Minas!

terça-feira, 23 de dezembro de 2008



as casas

procura em vão
quem na cidade procura
no burburinho da rua
na esquina da praça esquiva
alguma sombra antiga de alpendre
algum vestígio de vozes
no ausente casario

pergunta em vão quem pergunta
quem insiste em ver
o invisível
tempo do esquecimento

criaram asas as casas
com suas largas janelas
voaram delas as almas
os vutos
as aves
os jovens e donzelas
ou só de vazio se arquiteta
o lote vago
o terreno baldio
evaoraram-se os corpos
o choro das crianças
o rumor amoroso dos leitos

os bens de família
os desejos rarefeitos
a ostentação secular
dos nomes
dos móveis de jacarandá

para onde foram as casas
de ares nobres e solenes
a casa do João Jacinto
do Antônio Barbeiro
do Seu Rubens Frias
do seu Edson Fonseca
e tantas outras residências
de obscuro silêncio

procura em vão a liberdade
quem de memória abstrata
procura entre os escombros
da história
entre os dentes da engrenagem agônica
traços de pedra da cidade ausente





tudo em Itabira
respira a Drummond
a ruína do Pico do Cauê
sob a neblina de néon
a pedra no meio caminho
o minério de ferro
os portões de ferro
a estrada de ferro
a areia aurífera nos pulmões
o poeta sozinho
mais que Robson Crusoé
os passos aflitos de José
o menino de bicicleta
o som antigo da cidade
o souvenir nas butiques
a descompostura dos turistas
a memória dos mortos
o museu de eternas palavras
a musculatura da cidade cansada
o culto póstumo ao seu nome
a indiferença dos homens
ao sol de cada manhã

em Itabira tudo respira a Drummond


Poleminias

pois é poesia
não é linha reta
lata vazia
não é mímica
não é questão de fé
é palavra mínima
linguagem irrequieta
contra a falsa lírica
contra a massa falida
transpiração de atleta
é quando o arquiteto
a si mesmo
não se arquiteta
é quando o poeta
com fome
come seus versos
pois conversa afiada
não paga conta
pão com manteiga e café
pois é poesia
não é só manifesto
questão de fé
sentimento ou festa
alimenta-se de Apolo
de Narciso
de inferno e paraíso
tem seu lado de luz
de luta
tem seu lado funesto
é quando sujeito e objeto
se fundem
no adverso concreto
pois é poesia
não é só linha reta
luxo de asceta
é rua torta
lua morta
história incerta
casa viaduto e horta
concreta
engajada
marginal
épica
lírica
provisória
o que importa
a poesia tudo comporta
revolução e utopia
do córtex do cérebro
ao coração
ate que um dia
pela própria poesia
se arrebente de repente
a represa doverso
a veia horta
até que a chuva tudo inunda
encharque o rosto
a cidade
os cabelos da bunda

pois é poesia não é só rima
é duelo com palavra
espada
honra
esgrima
contra a mentira deslavada
contra ironia do riso
contra forma encomendada
contra a verdade absoluta
contra o a coisa
o abjeto abstrato
a ideologia barata
a mercadoria bruta
a heresia literária
contra a vida vagabunda
contra tudo o que não for epifania
contra nada
a nada serve a poesia



reflexão

há mais de dois mil anos
o Natal se repete
repleto de luzes e enganos
a mesma cena diária
a mesma festa literária
dita de modos diferentes

debaixo de árvores coloridas
repousam mendigos
objetos de vidro
senhores falidos
mulheres de luto
anjos de pelúcia
filhos descontentes
sonhos perdidos
livros não lidos
o planeta ferido
animais doentes

os dias se evaporam
vazios
mortos
violentos
tudo em tudo se reflete
tudo se embrulha
a estampa de luxo
o estômago o buxo
o burrinho de argila
o menino Jesus
seu pai velhinho
sua mãe tranqüila
com o mesmo papel de presente

um moleque de rua nasce a meia noite
sob o acoite do pai
sob os olhos da estrela guia
o galo eletrônico entoa hinos natalinos
a chuva cai
Deus chora
o sino toca
o boi passa
o tempo avisa
o trenó voa
a sirene apita

a vida inútil
cego ritual de sempre
segue seu calendário urgente

quinta-feira, 27 de novembro de 2008



Vivi entre homens/
que não me viram, não me ouviram/
Nem me consolaram”.
Murilo Mendes



atravesso em pânico
a multidão fantasma
como se de espelhos e miasmas
me multiplicasse em olhos
lábios e bocas
bundas e pernas
ruínas de palavras
roucas e lerdas
em ruas e becos da cidade eleita
me transfaço o feito
o por fazer desfaço
em mil faces neutras
entre fragmentos anônimos falsos sentimentos
a vida segue pela rua estreita
impossíel ver
impossível ouvir
impossível gesto
perpétuo movimento
no espaço opaco
em pânico passo a limpo
o tempo
imerso rumor do vento
meu sonho panorâmico
de fibra ótica e acrílico
de cismas e de cimento
de tudo após
sobre meu peito pesa

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

a fuga dos deuses

os deuses fugiram nesta manhã
ficou somente a terra nua
vazia de todo o sentido triste talismã letrado
desencantada e fria
nem zeus nem Buda
Zaratustra
Hiroxima
Nagaszaki ou tupã

n
nada alem da poesia adulta profecia
livre de todo o poder das tribos e dos titãs
dos falsa sabedoria dos reis
dos mestres e doutores dos templos
da hipocrisia cristã
da pálida alegoria dos dias
da saúde dos divãs

os deuses fugiram nesta manhã
anuncia a mídia global flamejante cortesã

quinta-feira, 20 de novembro de 2008



Ensaio
ViVaviola . Concerto, com os mineiros Pereira da Viola, Chico Lobo, Wilson Dias, Joaci Ornelas, Bilora e Gustavo Guimarães, realizado no Teatro Alterosa, nos dias 24, 25 e 26 de outubro. Belo Horizonte Minas Gerais.Sucesso total!

terça-feira, 18 de novembro de 2008







A educação pela Viola Caipira
Seis imagens sonoras de Minas

João Evangelista Rodrigues
O concerto VivaViola apresenta seis compositores e intérpretes da autêntica música de raiz, os violeiros Pereira da Viola, Chico Lobo, Wilson Dias, Bilora, Joaci Ornelas e Gustavo Guimarães. Instrumento fundamental na formação da identidade cultural de Minas e do Brasil, a viola continua presente nas festas religiosas e nas manifestações populares. Após um período de ostracismo, relegado a segundo plano, ressurge a partir dos anos 80 com toda a sua força e importância, reconquistando espaço na mídia e no mercado fonográfico. A viola está na moda, com todo respeito ao trocadilho.

“Uma educação pela pedra: por lições;para aprender da pedra, freqüentá-la;captar sua voz inenfática, impessoal(pela dicção ela começa as aulas).”
João Cabral de Melo Neto
O que pode nos ensinar uma pedra. E a viola, nos ensinaria alguma coisa? Bem, não seria totalmente correto afirmar que a viola caipira (dez cordas), à maneira do avião, foi inventada por algum gênio brasileiro. O que a maioria ignora ou finge ignorar, por conveniência ou preconceito inerente a um certo tipo de saber estabelecido e hegemônico, é que este instrumento foi e continua sendo o que mais fielmente traduz o sentimento, a alma e o saber do povo brasileiro, sobretudo do homem rural.

Desde que chegou ao Brasil, por volta de 1500, trazida pelos Jesuítas e utilizada na catequese dos índios, a viola permanece viva. Não é exagero afirmar que, ao chegar no Brasil, ela desempenha uma nova função: a de seduzir, conquistar e educar pessoas através de sua sonoridade particular e singela. Pode-se falar, então, parodiando o Poeta Pernambucano, de uma educação pela viola. Seja por sua capacidade de reunir pessoas, de sensibilizar mentes e corações, seja pela força de seu sotaque ao mesmo tempo mágico e realista.

O Violeiro e compositor, Wilson Dias, explica: “assim que foi semeada em solo brasileiro, a viola foi passando por diversas transformações. Através da miscigenação de raças, veio a ser a fiel companheira do "caipira", o homem do campo. Tornou-se, portanto, um instrumento de extrema importância cultural. Por toda sua história e pelo seu potencial inventivo e mobilizador de sentidos e sentimentos, a viola não passa despercebida. Faz parte da história do Brasil!”. Nem mesmo o ambiente pós-modrnizante e o alarido violento e ensurdecedor do neo-liberalismo, conseguem calar sua voz. A linguagem da viola, em sua diversidade, sobreviveu e se faz ouvir atualmente não só pelo conteúdo das mensagens veiculadas, mas devido a sua natureza afetiva e solidária. Ora discreta e piedosa, ora combativa. Ao longo do tempo, a viola vai cumprindo seu papel. Desperta o pendor artístico. Desbrava sertões. Acalma o espírito. Reúne o povo e ponteia suas esperanças. Canta e protesta conforme a hora seja de festa ou de luta. Está presente sempre que é convidada, melhor dizendo, convocada para defender a vida em suas mais diversas formas de manifestação. É pela viola que o cantador e compositor Pereira da Viola se define. “sou daqueles violeiros que, através do suporte histórico e sonoro da viola, grita por justiça, fala das questões que afligem a humanidade. Meto o dedo nas feridas de forma clara e sem medo. Por isso acho que a viola, pela sua história, pode ser também entendida como uma aliada no processo de transformação social”.
Assim como na América Latina, África e Caribe, o Brasil está passando por um momento de intensas transformações político-econômicas e socioculturais. Esse é um processo global que afeta, negativamente, sobretudo os países menos desenvolvidos aprofundando de maneira irreversível problemas históricos. Faz-se necessário, neste contexto, que a autêntica música de viola esteja inserida neste processo, como um dos principais pilares na formação cultural da nossa sociedade brasileira, completa Pereira.
Cinema sonoro

“No Sertão a pedra não sabe lecionar, e se lecionasse não ensinaria nada;lá não se aprende a pedra: lá a pedra,uma pedra de nascença, entranha a alma.”
João Cabral de Melo Neto
A educação pela viola, à maneira da pedra, se dá “de dentro para fora e pré-didatica”. Isto acontece no mais longe. Na intimidade mesma das casas, das coisas afastadas. Lá onde residem os mestres, os menestréis de antonce. Os cantadores de fibra. Afiados de palavra. Afinados dos instrumentos, todos da vida natural, feito igual ao que na pedra a faca se afia. Feito o que no tear se fia. Os que sem aprendizagem prévia, sabem. Por intuição. Por descoberta. Por sabe-se lá que sortilégios da sorte. Por engenhos de fé ou de precisão mais insatisfeita e essencial de necessidade humana primordial de se comunicar, de se descobrir e descobrir o mundo, o sentido das coisas ao seu redor, dos outros seres. Seja bicho ou homem. Seja planta ou ave. Seja água, fogo ou pedra. Tudo que, quando se tem verdade, cabe com justeza e estilo peculiar no som, na voz e nos acorde de uma viola de boa herança e procedência.

Assim, ouvir uma boa música de viola, no melhor estilo de nossa tradição, é ver. Olhar de perto as coisas. É observar e degustar o mundo em constante movimento. É viajar e desfrutar sons e sabores. Gestos e semblantes. Conhecer lugares e mistérios. O vasto mundo real e imaginário que, sendo imaginário, é mais vasto ainda. É fazer ou assistir a um cinema sonoro. Um filme incomum, povoado de imagens e de sombras. De luzes vindas da memória. Da tradição e da vida cotidiana. Das conquistas, perdas e danos do povo brasileiro ao longo de mais de meio século de história.

São cenas e cenários de muitas Minas, de vários mundos, de um país interior e anterior. Por isso, à frente de toda crise e pessimismos é preciso cantar, encantar, decantar o sobre nuvens. Desvelar o sono mineral das coisas insignificantes. Dar-lhes luz e cor, conforme seja o tom e a densidade da voz, da letra musicalizada. Viola signo sonoro. Imagem da vida. Cinema do cotidiano. De minha parte, sinto-me contente de participar deste movimento a favor da viola caipira nas diversas formas de ação: estudo, pesquisa, articulações e produção de eventos. Agrada-me a convivência com tantos artistas dedicados a esta questão e, sobretudo, a oportunidade de mostrar uma vertente de meu trabalho poético através das muitas parcerias que faço com eles. É o caso deste histórico concerto no qual serão interpretadas “Sem Desatino, feita com Pereira da Viola; Brasil Festeiro, com Wilsom Dias, meu mais novo parceiro, e Moda de Viola, com Joaci Ornelas.

Cena 1- O cantor Wilson Dias vê na viola poderes curativos. Uma forma de aliviar os males da alma brasileira. No Vivaviola, apresenta a composição inédita, “Brasil Festeiro”.
Segundo Wilson Dias, Brasil Festeiro é o retrato do País em que acreditamos. Foi feito exatamente parar ajuntar a viola e o tambor: dois instrumentos representativos da cultura brasileira. Parte da mesma cena é “Canção de Siruiz” – composta a partir de um fragmento do livro ”Grande Sertão Veredas”, de João Guimarães Rosa. Nela, o violeiro descobre territórios invisíveis. Ouve o som misterioso do sem-lugar das Gerais.

Cena 2- O cheiro dos raminhos de alecrim anuncia a presença do violeiro, cantador e compositor Chico Lobo, que apresenta um “catira”, música de sua autoria gravada no seu primeiro cd, “No Braço Dessa Viola” que lhe rendeu uma vitória significativa: ser um dos três finalistas no Prêmio Sharp, como revelação da Música Regional Brasileira.
Segundo Chico, esse é o momento para dividimos o palco e a vida, já que estamos na mesma estrada. É hora de unir nossas vozes para relembrar histórias, celebrar nossas conquistas e reinventarmos nossas utopias. Apresenta também “No Braço Dessa Viola” que segundo Chico resume todo seu trabalho neste refrão: “Ê viola que trago no peito/Ê viola meu pai que me deu/Pra cumprir a folia da vida tomara Deus”. Não é bonito? Termina o cantador tirando seu chapéu.

Cena 3 – Caminho de chão batido. Um homem descalço anda devagar. Observa a paisagem. Cisma de pássaros a vida. Segue curvado ao peso de sua bagagem: coisas, idéias, lembranças, desejos e sofrimentos acumulados ao longo de toda uma existência. Um cavaleiro vem pela mesma estrada empoeirada em direção oposta. Ao se aproximar, afrouxa a marcha de sua montaria. Apruma-se no arreio e fala com voz pausada: “Pois sim, senhor”. Silêncio. Sem desatino, a jornada segue.
É sem desatino, mas com destino certeiro que Pereira da Viola abre seu sorriso. Solta a voz e canta “Sem Destino”. Não se esquece, ainda, de despertar da Menina Flor, que dorme e sonha, dentro de um caixão de ouro, no fundo de um rio encantando. Canção feita em parceria com o menestrel cantador Josino Medina.

Cena 4 - O interior “ouvisto” através da música de Gustavo Guimarães. Violeiro consciente de sua missão e sincero no que faz. Em breve estará lançando seu primeiro CD “Vaqueiro”. Este trabalho é todo autoral e foi cuidadosamente produzido. Neste concerto Gustavo canta "Boi de Santana”, composta em homenagem à cidade de João Pinheiro, onde o artista cresceu. Fala um pouco da história do lugar, que antes era conhecido como Santana do Alegre. Dizem que o lugar recebeu esse nome por causa de um boi de nome Alegre que todas as noites mugia vagueando pelo arraial. O mugido do boi, conta Gustavo, deixava a população admirada, pois, ao mugir, o boi Santana parecia cantar. Já na música "A voz do Rio" reporta a uma cena mais triste e realista. É um apelo ecológico a favor do sofrido Rio das Velhas.

Cena 5 – O Sol quente do Norte de Minas invade o palco. Bilora toca seu “Calango na Cidade”. Esta música lhe valeu 30 prêmios em festivais da canção, realizados em diversas regiões do país.” Esta composição, segundo Bilora, representa um dos melhores momentos de meu trabalho musical”. Interpreta também “Toada do Amor”, de sua autoria.
Bilora nasceu na beira do Córrego do Norte, Vale do Mucuri, município de Santa Helena de Minas. Cresceu em contato com a cultura popular. Ouviu batuque e folia. Recebeu influência do universo caipira pelo rádio. Com estes elementos que foram zelosamente cultivados vem tecendo a história de sua vida artística.

Cena 6 – Um poeta sofre em solidão suas dores de vida e de morte. Agoniado pede um amigo violeiro para cantar uma moda de viola que possa aliviar a dor que arde no peito. Mas que moda seria esta capaz de aplacar esse mal sucedido? Seria uma moda de viola bem caipira? Seria uma moda que brota de dentro da alma? Nesse caso o remédio foi “Moda de violeiro”,uma pungente evocação de um profundo sentimento. Ornelas é cantador de paisagens sertânicas e ressonâncias renascentistas. De voz sincera e alma desprendida, mas comprometido com a historia de sua gente. Nesta mesma cena, Ornelas canta a saudade de um amor de longe, na cantiga “Coqueiro vai”, um canto de tradição popular e recolhido em versos por Guimarães Rosa e adaptado por Josino Medina.

Fim- Ouvir uma boa música de viola exige, em alguns momentos, concentração e disposição de espírito. Só assim o espectador pode empreender viagens sonoras e rítmicas. Descobrir e usufruir novos universos. Distantes e distintos. É que a viola caipira, de dez cordas, possui magia própria. Eleva o espírito. Amplia a percepção. Educa a sensibilidade. Aprimora o gosto. Não importa se fala de temas comuns e cotidianos. Se fala do amor, da vida na roça, da natureza, ou se conta uma história acontecida ou inventada. Quando cultivada com maestria e sinceridade, a viola sempre toca o coração e a mente das pessoas. Vivaviola. Seis imagens sonoras. Viva os violeiros de Minas. São cenas. Cenários. São sons. Só sombras são.

Cena 5 – O Sol quente do Norte de Minas invade o palco. Bilora toca seu “Calango na Cidade”. Esta música lhe valeu 30 prêmios em festivais da canção, realizados em diversas regiões do país.” Esta composição, segundo Bilora, representa um dos melhores momentos de meu trabalho musical”. Interpreta também “Toada do Amor”, de sua autoria.
Bilora nasceu na beira do Córrego do Norte, Vale do Mucuri, município de Santa Helena de Minas. Cresceu em contato com a cultura popular. Ouviu batuque e folia. Recebeu influência do universo caipira pelo rádio. Com estes elementos que foram zelosamente cultivados vem tecendo a história de sua vida artística.


Cena 6 – Um poeta sofre em solidão suas dores de vida e de morte. Agoniado pede um amigo violeiro para cantar uma moda de viola que possa aliviar a dor que arde no peito. Mas que moda seria esta capaz de aplacar esse mal sucedido? Seria uma moda de viola bem caipira? Seria uma moda que brota de dentro da alma? Nesse caso o remédio foi “Moda de violeiro”,uma pungente evocação de um profundo sentimento. Ornelas é cantador de paisagens sertânicas e ressonâncias renascentistas. De voz sincera e alma desprendida, mas comprometido com a historia de sua gente. Nesta mesma cena, Ornelas canta a saudade de um amor de longe, na cantiga “Coqueiro vai”, um canto de tradição popular e recolhido em versos por Guimarães Rosa e adaptado por Josino Medina.


Fim- Ouvir uma boa música de viola exige, em alguns momentos, concentração e disposição de espírito. Só assim o espectador pode empreender viagens sonoras e rítmicas. Descobrir e usufruir novos universos. Distantes e distintos. É que a viola caipira, de dez cordas, possui magia própria. Eleva o espírito. Amplia a percepção. Educa a sensibilidade. Aprimora o gosto. Não importa se fala de temas comuns e cotidianos. Se fala do amor, da vida na roça, da natureza, ou se conta uma história acontecida ou inventada. Quando cultivada com maestria e sinceridade, a viola sempre toca o coração e a mente das pessoas. Vivaviola. Seis imagens sonoras. Viva os violeiros de Minas. São cenas. Cenários. São sons. Só sombras são.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008




“...são elas mesmo, talvez, a causa de todos os meus sofrimentos.” Thomas Man in Desilusão

não cultive grandes palavras
nem para o bem
nem para o mal
a retórica gloriosa
guarde-a para a metáfora dos mortos
para o frio memorial dos imortais

prefira a desordem do discurso fluvial
à ordem absoluta do que não canta
o triste
o trivial
não tenha medo do silêncio
paisagem serena e reflorida

na solidão dos lugares mais distantes
cresce o signo original
sem montanhas
sem horizonte
sem nenhum ritual além de seu sentido básico

seja consigo mesmo
o que sem letras se mostra
não tentes
não provoques
não resista ao fluxo do tempo inexorável

quanto ao resto
deixe o resto pra o restante
das criaturas sem alma
jamais escreva por divertimento ou lazer
senão pelo prazer dos olhos
pela vibração dos nervos
por pura necessidade do espírito

elimine a lacuna que insiste
entre vocabulário e coração
esta será a escrita de seus sentidos

não busque nas letras a felicidade
nem a verdade em sua herança literária
nada espere delas

é nas palavras ásperas e belas
onde a mais pungente desilusão habita

não grite
não lamente
não se deixe levar palas aparências
nem do mundo nem dos homens

continue em silêncio
seu ofício sem glorias
em nome dos que iniciaram
essa maldita e primitiva
a infinita solidão da escrita

não cultive grandes palavras

terça-feira, 14 de outubro de 2008


onde se esconde em ti
o ser humano
em teu sorriso límpido
em tua face alva
em teu gesto arcano
onde o homem de sempre
sob oculto manto

na solidão que tudo vence
em tua ausência pelo sono
onde em ti esconde em fausto abrigo
o amigo falso o ínvio ser de enganos

o que perco a caminho
me constrói
erige em mim se separa
poeira e pedra
áspera poesia
arranco da carne viciada
a rosa
a felpa
a fantasia do herói
a cada dia parto
livro-me do lírico espinho

sábado, 11 de outubro de 2008

manifesto

a viola é de festa
é de mutirão
é de quem se manifesta
na cidade e no sertão

é memória coletiva
voz ativa e comunhão
tem o som da patativa
urubu não cana não

a viola é companheira
do violeiro e da canção
tem viola feiticeira
nesta eu não ponho a mão

viola de sete fitas
sete dias da semana
sete morenas bonitas
sete sinas de cigana

viola de cantoria
devoção de padroeira
de congado e de folia
de batuque e brincadeira

instrumento delicado
relicário de madeira
guardiã do sentimento
da cultura brasileira

Concerto Vivaviola
60 Cordas em Movimento
A viola caipira nunca esteve tão viva como em nossos dias. Prova disto é o concerto VivaViola que tem a participação de seis compositores e intérpretes da autêntica música de raiz, os violeiros Wilson Dias, Pereira da Viola, Joaci Ornelas, Gustavo Guimarães, Chico Lobo e Bilora. Instrumento fundamental na formação da identidade cultural de Minas Gerais e do Brasil, a viola, continua presente nas festas religiosas e nas manifestações populares. Após um período de ostracismo, relegada ao segundo plano, ressurge nos anos 80 com toda a sua força e importância, para reconquistar espaço na mídia e no mercado fonográfico. A viola está na moda, com todo respeito ao trocadilho. As apresentações acontecem nos dias 24, sexta-feira às 21:00; dia 25, sábado às 21:00 e no dia 26, domingo às 19:00, no Teatro Alterosa, na Av. Assis Chateaubriand, 499 Floresta. O espetáculo VivaViola é uma produção coletiva e mostra além de trabalhos autorais, a tradição da viola caipira, das cantigas de roda e das folias de reis. Os seis violeiros, cada qual com sua peculiaridade, trazem em suas músicas, a viola caipira no âmbito da música mineira, e retratam as influências dos lugares de onde vieram na valorização da criatividade plural e representação de genuínas formas de expressão. Com batuques, modas de viola, toadas entre outros.

Novo conceito

Ao contrário das formas costumeiras de apresentação musical que envolve vários artistas, o VivaViola propõe um formato diferenciado na utilização do palco. Um novo conceito em que os artistas permanecem no palco durante todo o show, com sua viola caipira. Cada músico fará apresentação solo e com um violeiro convidado. A abertura e encerramento será uma bela cantoria com interação junto ao público. No universo dos violeiros há várias afinações. Nesse espetáculo serão “60 cordas em movimento”, durante aproximadamente 1h40 de espetáculo.
Repertório variado
Por se tratar de um espetáculo coletivo, o repertório é amplo e variado, formado basicamente de músicas autorais e de domínio público – que serão apresentadas de modo solo e também em parcerias. Entre as músicas do repertório, Wilson Dias apresentará “Brasil Festeiro”, composição inédita feita em parceria com João Evangelista Rodrigues. E Pereira da Viola interpretará a conhecida “Menina flor” de sua autoria
e Josino Medina. Joaci Ornelas cantará “Moda de Violeiro”, uma de suas parcerias junto ao também poeta e compositor João Evangelista Rodrigues. Enquanto, Gustavo Guimarães cantará “A voz do rio” que faz parte do seu primeiro CD, “Vaqueiro” a ser lançado em breve. Chico Lobo apresentará uma de suas músicas mais apreciadas, “No Braço dessa Viola”. E Bilora apresentará o seu “Calango na cidade”.

Mutirão de vozes
Verdadeiro mutirão de vozes, o espetáculo VivaViola é um panorama do que há de mais representativo na música de viola produzida por uma nova geração de compositores mineiros. Reflete, portanto a formação, as influências e a visão de mundo de cada um dos artistas. Todas essas diferenças e diversidade de linguagens têm um elo comum e o mesmo suporte: a tradição da viola enquanto fator de formação da identidade cultural brasileira, e elementos fundamentais de nossa cultura popular. O violeiro Chico Lobo – um dos mais ativos violeiros do cenário nacional e internacional, idealizador e apresentador do Programa de TV Viola Brasil, especial veículo de divulgação da viola (desde 2003) -, ressalta a importância deste concerto ao dizer que: “É sempre bom juntar minha viola com a dos companheiros. A viola é de festa, é de mutirão, é de coletividade. Sendo assim, se uma viola já é bonita imagina quando muitas se juntam numa cantoria certeira”. Para Gustavo Guimarães – um dos legítimos representantes da nova geração da viola -, o concerto tem um significado especial é um momento de afirmação e ascensão da viola. Além disso, tem como princípios comuns à defesa de valores éticos morais, culturais e espirituais, que giram em torno da música de viola.
Pereira da Viola, um dos artistas mais reconhecido de Minas e do Brasil, presidente da Associação Nacional dos Violeiros (ANVB), analisa o concerto VivaViola no contexto do movimento nacional em torno deste instrumento.
Ele afirma que, “Em Belo Horizonte sempre nos deparamos com um certo vazio se comparado a São Paulo e até mesmo a outros estados, no processo de identificação, estruturação e expansão deste movimento musical. Compreendo que este momento é profundamente oportuno, para esta ação coletiva que estamos desenvolvendo”.

A opinião de Wilson Dias - que tem direcionando sua carreira para o encontro entre a tradição e o urbano com um viés especial a cultura popular -, reforça poeticamente essa idéia, sobre a valorização da música de viola caipira que vem crescendo a cada dia, ao dizer: “cabe a todos nós o trabalho de manter enlaçados os fios que nos ligam, de maneira que a nossa rede de vida permaneça ‘redeviva’, em permanente frescor construtivo”.

Fiel às suas origens, o violeiro Bilora – um dos mais premiados violeiros do Brasil -, faz questão de ressaltar que “A viola representa a cultura popular brasileira do interior. Está presente na alma desse povo e tem cheiro de mato. Este concerto será a festa da música semeando o belo som da viola”, afirma o compositor.

Um dos responsáveis pela realização do I Seminário Nacional de Viola Caipira (evento que reuniu os principais violeiros do país, realizado em Belo Horizonte no primeiro semestre deste ano), Joaci Ornelas cujo trabalho é essencialmente ligado à viola caipira, como tradução musical desde o estilo renascentista, barroco, até os batuques e composições próprias -, afirma que este espetáculo tem dupla importância pessoal e artística. “Primeiro me permite colocar em contato direto com o trabalho musical de outros artistas. Segundo por que favorece uma troca de informações, sentimentos, experiências com artistas que acreditam numa vida mais justa e bela”.
Serviço
Concerto: VivaViola - 60 cordas em movimento.

Local: Teatro Alterosa (Av. Assis Chateaubriand, 499 – Floresta).
Datas: 24, 25 e 26 de Outubro de 2008
Horários: Sexta e Sábado às 21h // Domingo às 19h

Informações:
Picuá Produções / Nilce Gomes: (31) 3427 9670 / 9113 1626
Terra Boa Produções / Daiany Durães: (31) 3482 6674 / 8315 0450
Viola Brasil Produções / Ângela Lopes: (31) 3459 8026 / 9954 6580

Ingressos: Teatro Alterosa (31) 3237 6611
Valor: Inteira R$20,00. Meia entrada R$10,00

sexta-feira, 10 de outubro de 2008


é isto o amor
se for assim
estranho
ermo e cego
ai de ti
amor
ai de mim
ai de todos nós

eo desamor o que seria